Então eu o vi descendo a calçada e meu coração enterneceu no
mesmo instante em que meu olhar o fitou. Eu estava ansiosa para vê-lo, não sei
exatamente dizer se o dia estava frio ou se era eu que congelava de nervosismo
por dentro. Foi, então, que ele chegou, sorriu e eu senti tacarem uma pedra no
enxame de borboletas que habita meu estomago. Dali pra frente eu soube o que de
mim mesma tentava esconder, agora estava tarde demais.
Rapidamente o carro parou ao seu lado e quando ela se virou
o sol refletiu em seu rosto exaltando toda a beleza que seus olhos ligeiramente
claros possuíam. As lágrimas emergiram numa rapidez e eu tive de ser mais
rápida para não as deixar escorrer, tive de fingir um sorriso dos mais difíceis
e, então, eu soube ali que jamais poderia competir com ela. A maior tolice foi
permitir-me a mais ínfima esperança, a realidade caiu sobre mim e destroçou em
pó qualquer borboleta que ainda estivesse a bater asas. E tudo tornou-se vazio,
apenas alguns poucos cacos restaram a sacolejar dentro do peito.
De repente me vi absolvida por todo aquele drama, mais uma cena teatral, mais um espetáculo cuja a tola atriz, péssima atriz, diga-se de passagem, tem de aprender a lidar com as tragédias inevitáveis. Nada de novo, um roteiro clichê, uma personagem medíocre, a única diferença é a intensidade, cada vez maior, mais forte.
Eu sabia que não deveria ter ficado ali sentada, ali deitada, ali na porta. Foi pressentido, tive tempo de fechar os olhos, se eu pensar bem, talvez eu ache as brechas por onde poderia ter passado e evitado, sim, pois se foi previsto, talvez, pudesse ter sido evitado. Mas e agora? O ontem já esvaiu entre os dedos, a lembrança é a única forma, incerta, de dizer que ele existiu. Agora não dá pra correr, não posso fechar os olhos, pois o mundo ainda estará por trais das minha pálpebras. Agora é lidar, como sempre o fiz, como sempre o farei, até que este torne-se meu verbo passado onde hei de padecer.